domingo, 21 de março de 2010

O DESAFIO DA INCLUSÃO

O DESAFIO DA INCLUSÃO


A Educação Inclusiva surgiu, e vem crescendo no mundo inteiro, com base no pressuposto de que TODA criança tem direito à educação de qualidade e de que, portanto, os sistemas educacionais, têm que mudar para poder responder a essas necessidades. O interesse nesse tema está provocando a revisão de numerosos sistemas educacionais, que por conseqüência, implementaram ações condizentes como fazer o possível para que a educação chegue a todos os alunos em contextos escolares e não segregados. Isto tem fomentado o surgimento e a defesa da chamada educação inclusiva, que coloca em juízo de valor, por um lado, o pensamento existente sobre as necessidades educacionais especiais, e, por outro lado, estabelece uma forte crítica às práticas da educação em geral.
Esta nova orientação assume caráter internacional. Cabe destacar o importante trabalho que estão realizando os organismos como o UNICEF e a UNESCO em prol de que a educação chegue a todas as crianças em idade escolar. Isto pode ser comprovado na série de ações e reuniões internacionais que têm sido convocadas para conseguir chamar a atenção do mundo a este respeito.
Dentre essas reuniões, destaca-se:
A Convenção dos Direitos da Criança realizada em Nova York em 1989;
A Conferência Mundial sobre “Necessidades Educativas Especiais”, desenvolvida em Salamanca (Espanha), 1994;
A mais recente, acontecida no ano de 2000, em Dakar (Senegal), com o título de Fórum Consultivo Internacional para a Educação para Todos”.

Talvez, entre todas essas conferências caiba destacar aqui a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, de 1994, em Salamanca, por ser a que de maneira mais decisiva e explicitamente contribuiu por impulsionar a Educação Inclusiva em todo o mundo. Nessa Conferência, participaram noventa e dois governos e vinte e cinco organizações internacionais, que reconheceram a necessidade e urgência de que o ensino chegasse a todas as crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais no âmbito da escola regular.
Com este fim, os especialistas ali reunidos, estabeleceram um plano de ação cujo princípio norteador mostrava que as escolas deveriam acolher a todas as crianças, independente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas e outras. A partir daí, as escolas se encontram frente ao desafio de desenvolver uma pedagogia capaz de educar com êxito a todas as crianças, inclusive àquelas que têm deficiências graves. Além disso, planeja-se que as escolas devem ser comunidades que atendam a todos, já que as diferenças humanas são naturais, diga-se existem, havendo, porém a necessidade de adaptar a aprendizagem a cada criança.
Nessa perspectiva, esta Declaração proclama que:

1. Todas as crianças têm direito à educação e deve-se dar a elas a oportunidade de alcançar e manter um nível aceitável de conhecimentos;
2. Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhes são próprias;
3. Os sistemas de ensino devem ser organizados e os programas aplicados de modo que tenham em conta todas as diferentes características e necessidades;
4. As pessoas com necessidades educacionais especiais devem ter acesso às escolas comuns e
5. As escolas comuns devem representar um meio mais eficaz para combater as atitudes discriminatórias, criar comunidades acolhedoras, construir uma sociedade integradora e alcançar a educação para todos.( Declaração de Salamanca, 1994, p.11).


O princípio da Declaração como vemos é que as escolas devem acolher a todas as crianças ou jovens que têm necessidades decorrentes de suas características de aprendizagem, incluindo crianças com deficiências, superdotadas, de rua, que trabalham, de populações distantes, nômades, pertencentes a minorias lingüísticas, étnicas ou culturais, de outros grupos desfavorecidos ou marginalizados. Para isso, sugere que se desenvolva uma pedagogia centrada na relação com a criança, capaz de educar com sucesso a todos, atendendo às necessidades de cada um, considerando às diferenças entre elas.
Portanto, estar na escola e ser aceito pela comunidade escolar é um direito de qualquer pessoa e deve ser assegurado pelo Estado. Na mesma linha, a Convenção dos Direitos da Criança (ONU-1989), como um instrumento legal das Nações Unidas, estabelece que:

“Os Estados assegurarão a toda criança sob sua jurisdição os direitos previstos nesta Convenção sem discriminação de qualquer tipo, independentemente de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra, origem nacional, étnica ou social, posição econômica, impedimentos físicos, nascimento ou qualquer outra condição da criança, de seus pais ou de seus representantes legais”. (ONU 1989, Art. 2).


No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente é a lei que ratifica a Convenção e estabelece que...

“nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punindo na forma da lei qualquer atentado por ação ou omissão aos seus direitos fundamentais” (Art. 5°, p.5).

O respaldo garantido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, garante e assume a responsabilidade de todos pelo cumprimento da lei, em não reduzir qualquer criança ou adolescente a nenhuma fonte de discriminação, e principalmente, nos casos de deficiência, não reduzi-lo a sua deficiência, pois, como afirma Mantoan (2005, p. 42): “apesar de ter características peculiares, ele tem personalidade e carrega uma história e muitas experiências que o tornam único”.
A missão de incluir e sem dúvida, trabalhar a diversidade também se mostra presente no discurso legal, abordado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente:
“É dever de todos zelar pela dignidade da criança e do adolescente, colocando-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor” (Art. 18, p. 8).

E como dever de todos, zelar pela educação de nossas crianças, a Declaração de Salamanca afirma que:

“enquanto escolas inclusivas fornecem o contexto favorável para atingir oportunidades iguais e participação total, no processo de ensino e aprendizagem, seu sucesso requer um esforço articulado não somente entre professores e pessoal da escola, mas também entre colegas, pais, famílias e voluntários. A reforma das instituições sociais não constitui somente uma tarefa técnica; ela depende, sobretudo, da convicção, compromisso e boa vontade dos indivíduos que constituem a sociedade”. (UNESCO, 1994, p. 11)

Também encontramos princípios de defesa de uma educação aberta a todos no texto da nossa Carta Magna – a Constituição Brasileira de 1988, onde assegura as todas as crianças brasileiras o direito de “ser”, sendo diferente nas escolas, instituindo como um dos princípios do ensino a “igualdade de condições de acesso e permanência na escola” (Art. 206, inciso I). Ao eleger como fundamento da nossa República a cidadania e a dignidade da pessoa humana (art. 1°, incisos II e III), e como um dos seus objetivos fundamentais [...] “a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3°, inciso IV) ela se adiantou à Declaração de Salamanca, que preceitou em 1994:

[...] “todas as escolas deveriam acomodar todas as crianças, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas ou outras. Deveriam incluir todas as crianças deficientes e superdotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de origem nômade, crianças pertencentes a minorias lingüísticas, étnicas, ou marginalizados. As escolas têm que encontrar a maneira de educar com êxito todas as crianças, inclusive as que tem deficiências graves”.


Só por estes dispositivos legais não se poderia negar a todos os alunos brasileiros, o acesso a uma mesma sala de aula, nas escolas comuns. Mas, temos perdido muito tempo e desperdiçado os esforços dos que lutam em favor da inclusão escolar, reconhecendo e valorizando as diferenças, em todos os níveis de ensino.
Segundo a lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN (art.58 e seguintes), o “atendimento educacional especializado será feito em classes, escolas, ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular” (art. 59, § 2°, p.20).
Mas, não cabe qualquer interpretação a este dispositivo, sendo que a interpretação a ser adotada deve considerar que esta substituição não deve ser admitida em qualquer hipótese, independentemente da idade da pessoa. A interpretação errônea que admite a possibilidade de substituição do ensino regular pelo especial está em confronto com o que dispõe a própria LDBEN em seu artigo 4°, inciso I e em seu artigo 6° e com a Constituição Federal, que também determina que o acesso ao Ensino Fundamental, é obrigatório (art. 208, inciso I).
Portanto, o direito ao atendimento educacional especializado previsto nos artigos 58, 59 e 60 da LDBEN (Lei 9394/96) e também na Constituição Federal, não substitui o direito à educação (escolarização) oferecida em classes comuns da rede regular de ensino. Vale lembrar que a LDBEN, utiliza as expressões “serviços de apoio especializado na escola regular” e “atendimento especializado”, como sinônimos de atendimento educacional especializado e apenas diz que estes podem ocorrer em classes ou escolas especiais, quando não for possível a sua oferta em classe comum. A LDBEN não diz que a escolarização poderá ser oferecida em ambiente escolar à parte.
A tendência atual é que o trabalho da Educação Especial garanta a todos os alunos com deficiência, o acesso à escolaridade, removendo barreiras que impedem a freqüência desses alunos às classes comuns do ensino regular. Assim sendo, a Educação Especial, começa a ser entendida como modalidade que perpassa como complemento ou suplemento, todas as etapas ou níveis de ensino. Esse trabalho é constituído por um conjunto de recursos educacionais e de estratégias de apoio colocados à disposição dos alunos com deficiência, proporcionando-lhes diferentes alternativas de atendimento, de acordo com as necessidades de cada um.
A Educação Inclusiva, garante o cumprimento do direito constitucional indisponível de qualquer criança de acesso ao ensino fundamental, já que pressupõe uma organização pedagógica das escolas e práticas de ensino que atendam às diferenças entre os alunos, sem discriminações indevidas, beneficiando a todos com o convívio e crescimento na diversidade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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DIVERSIDADE E INCLUSÃO!


Se existe necessidade de inclusão é porque muitos ainda são excluídos. As relações sociais são formadas pelo esforço dos indivíduos para diferenciar, se destacar, e isso facilmente leva a desqualificar o outro, mesmo que existam princípios éticos de igualdade e fraternidade. O grande desafio da educação contemporânea é mudar este quadro.
Na última década, as políticas públicas educacionais no Brasil têm buscado não só sensibilizar os profissionais que atuam ou pretendem atuar em educação para a realidade da inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais em redes regulares de ensino, mas, sobretudo, como atuar, dadas algumas especificidades que o caso requer.
Sabendo que a base do desenvolvimento das relações humanas é a diversidade, se faz necessário trabalhar nas escolas desde cedo, a preparação dos alunos para abrirem espaços e receberem seus colegas com deficiência, e da mesma forma, faz-se necessário que este desafio se estenda aos pais e comunidade escolar, para compreenderem, acreditarem e colaborarem para que esta mudança se concretize com vantagem para todos.
Uma vez que esses cuidados e práticas sejam tomados e efetivados, mais eficaz será o processo de inclusão. Este é o movimento da inclusão: do todo para o uno, mas sempre com qualidade e seriedade. É isto que falta nas redes escolares, sejam elas públicas ou privadas.
Percebe-se a urgência e a necessidade de se enfrentar o desafio da inclusão escolar e de colocar em ação os meios pelos quais ela verdadeiramente se concretiza. Por isso, temos de recuperar o tempo perdido, arregaçar as mangas e promover uma reforma estrutural e organizacional de nossas escolas comuns e especiais.
Fica claro que a grande missão de ensinar, não é submeter o aluno a um conhecimento pronto, mas prover meios pelos quais, com liberdade e determinação, ele possa construir novos saberes, ampliar significados, na medida de seus interesses e capacidades. Envolve, necessariamente, libertar o aluno do que o impede de fazer o seu próprio caminho, pelas trilhas do conhecimento e de valorizar todo o seu esforço não só para aprender como também para se sentir aceito, fazendo parte de um meio que lhe pertence.
Sempre há um momento para uma grande virada!